Por João Carlos da Cunha Moura (@viagemaleatoria e http://viagemaleatoria.wordpress.com)
Dando continuidade aos trabalhos sobre a análise de torcidas na região Nordeste (em especial no Maranhão), vamos abordar hoje um assunto que é controverso: o papel da mídia na escolha do clube de futebol.
Controverso porque aquele que é influenciado jamais admite tal fato, e acaba por levar o discurso do “faço o que quero” como discurso declarado, avisando que as suas atividades e gostos são escolhas próprias, não sendo influenciados por qualquer que seja o meio externo.
Balela. Todos nós sofremos influências externas e por mais que escolhamos nossos gostos, estes sempre terão uma influência externa: seja o grupo de amigos, os locais que se frequenta ou os programas que assistimos na televisão. Estes últimos então formam mais nosso gosto do que qualquer outra coisa.
A mídia se baseia em produção de massa, a chamada indústria cultural. Este tipo de produção é bom por um lado, pois dissemina mais a cultura para outros lugares que talvez não se chegasse. No entanto, este tipo de produção acaba por se integrar nas outras culturas, o que aniquila o senso crítico da sociedade, ainda mais no comodismo o qual o Brasil insiste.
Com o futebol aqui do Nordeste foi assim. Até a década de 1960, a capital nacional era o Rio de Janeiro e por ser uma cidade litorânea, as ondas de rádio eram frequente e facilmente passadas para o resto do Brasil, afinal todo o território nacional deve saber o que se passa na sede do seu país. Logo, era comum ver pais de famílias com os trambolhos dos rádios nas pernas na porta de casa ouvindo partidas de futebol dos times do Estado da Guanabara. Como o Maranhão, e na maioria dos outros estados do Nordeste, não tinham um futebol profissionalizado ou de pouco apelo no interior dos Estados era comum que começasse a torcer para os times da Guanabara (futuro Estado do Rio de Janeiro). E sabemos como é futebol, talvez não exista algo mais hereditário que este esporte.
Passando de pai para filho, as paixões se disseminaram e hoje, às vezes, é possível se imaginar no próprio Rio de Janeiro andando em alguns estados do Nordeste, com várias bandeiras rubro-negras, cruzes de malta, bandeiras tricolores ou a estrela solitária sendo empunhadas como se a bandeira do próprio estado fosse. Nada estranho em nossas terras.
Vendo que essa paixão seria algo bem rentável, a maior das redes de TV no Brasil (carioca, por sinal) resolver mostrar sua força e transmitir para a televisão jogos dos clubes locais. Locais para eles, e distantes da nossa realidade. Sonhadores que ficamos, ao ver estádios lotados, choro e riso em vitórias e derrotas que ganhavam as páginas dos jornais com o nome de batalhas, de guerras e que aumentavam ainda mais o amor por aquele clube que “tudo ganha” ou que é “brioso nos gramados”.
Criaram-se os mitos: o garoto dinamite, o galinho de quintino, o rei da raça, o canhotinha de ouro, a patada atômica etc. Todos com seus rostos estampados na TV, com matérias de página inteira, inclusive nos jornais das nossas terras, que pouco ou nada tinham a se orgulhar dos clubes daqui (ou não tinham ou sabiam que não era mais rentável se falar dos clubes daqui).
Um adendo aqui se faz especial: o caso Pelé. Muitos falam que se mídia fosse mesmo uma forma de escolher o clube, todos aquela época torceriam para o Santos, por causa de Pelé. O problema é que a mídia que foi feita era em cima da figura, do mito, do Rei do Futebol. As expressões que se viam eram de que se ia ao estádio para ver o Pelé (e não o Santos) jogar. Guerras paradas ou vaias dos torcedores do Bahia ao zagueiro baiano que impediu um gol, eram fatos atribuídos à figura de Pelé e não ao grupo de jogadores com o qual jogava.
Ainda assim, não é desmerecer os jogadores acima citados, mas não difícil perceber a influência midiática nesse ponto, até colocar um jogador ou mesmo um clube de “time de guerreiros” como sendo aquele que deve ser escolhido.
Claro que a imposição não é (e nem pode ser) externada de forma abrupta e de dizer “você tem que torcer para nossos times”, mas é assm mesmo que funciona a imposição midiática, é feita nos detalhes, com pequenos apontamentos. É justamente dando matéria e visibilidade a um time, ou a um jogador que representa o “espírito” da equipe. Alienados, como estamos, não paramos para dispensar um poucio de atenção crítica às notícias que nos são transmitidas (e não só para o futebol, política também é um problema nesse caso). Somos assim, não paramos para pensar, apenas aceitamos.
A publicidade que se dá aos times do Eixo (Rio-SP), sacrifica a identidade do indivíduo, porque reitera sua dependência em relação ao futebol, transformando-o em mercadoria. Essa mesma indústria cultural que usa a publicidade e nos apequena diante de seu poder, deixamos de ser indivíduos, cidadãos para sermos ouvintes ou telespectadores. Vivemos em uma sociedade de espetáculos, que, no futebol, necessita da ideia do “time de ponta” ou do “time de elite” para ser reconhecido como tal. Uma vez não estando na “elite do futebol”, todos são marginalizados, e os que lutam ou defendem as cores desses clubes não são considerados em estatísiticas.
A “briga” de emissoras e clubes pela transmissão e cotas de TV revela muito mais do que a mera transmissão de futebol, é uma disputa pelo controle da mídia e da publicidade para os times. Mas aí é outra história.
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